18.5.07

Cozer em lume brando

O Dr. Costa, outrora um super-ministro, trocou o posto de número dois do governo pelo de candidato a presidente da maior autarquia do país. Como todos nós nos recordamos, o Dr. Costa era conhecido pelos seus planos de combate aos incêndios que primavam, geralmente, por multiplicar o número de hectares ardidos à medida que o Verão avançava. Desde aqueles tempos imemoriais em que o Dr. Costa garantia que a época dos incêndios já era, prometendo meios infinitos para combater um flagelo cíclico no ano imediatamente a seguir, que o Dr. Costa percebeu que os incêndios queimam e que não há retórica que resista ao exercício.

Ora, o mesmo Dr. Costa, numa lógica de sacrifício exemplar que mais tarde lhe pode trazer dividendos, decidiu, antes mesmo de começar a época da caça ao sobreiro (um cavernoso desporto nacional), aceitar o presente envenenado que o Eng. (?) Sócrates generosamente lhe endossou, saltando directamente para a panela que pode cozê-lo em lume brando. No entanto, julgo que ele percebeu a tramóia: na realidade era urgente uma remodelação cosmética no governo para distrair o povo. Como o Dr. Pinho sempre diverte a malta, razão pela qual estava indisponível, e como é muito complicado despedir ministros invisíveis que não se sabe onde estão nem onde andam, sobrou o Dr. Costa que era, a título de curiosidade, o último dos três ministros de estado iniciais.

Quanto a mim, o Dr. Costa esgarifou-se* do governo a tempo. Prefere por agora arriscar a tal cozedura mínima do que morrer abruptamente na gigantesca fogueira nacional que deve estar prestes a começar. São apenas opções: no fundo, é sempre bom ter dois caminhos, duas escolhas e, vá lá, uma possível escapatória. O Dr. Costa, inteligente como de costume, limita-se a estancar, por agora, as pequenas fagulhas correndo ainda o risco sério de vir a ser um putativo herói socialista se vencer a câmara. E pelo meio sempre se livra dos carros-bomba, dos helicópteros e dos extintores que, neste país, parece que raramente funcionam.

*termo muito comum no Bairro da Nazaré que significa fugir, bazar, pôr-se a milhas.