31.5.09

Eleições na sua real dimensão

Não se ouve uma única palavra sobre a revisão do actual quadro de referência estratégica, não se ouve uma única palavra sobre as consequências do Tratado de Lisboa, não se ouve uma única palavra sobre os destinos de Portugal e a sua posição estratégica nesta Europa cada vez mais alargada, não se ouve uma única palavra sobre o que farão as empresas e os trabalhadores portugueses com a deslocalização económica para o leste da União Europeia, não se ouve uma única palavra sobre despoluição e qualidade das águas, não se ouve uma única palavra sobre a competitividade da cidadania.

Moita Flores

A diferença entre nós e eles, é que entre os social-democratas ainda há quem, sem qualquer tipo de partidarite aguda, consiga colocar as coisas na sua real perspectiva. Infelizmente, não abundam na política homens com esta dimensão! Nem aqui, nem lá, nem noutro qualquer lugar (leia-se: partido).

2 comentários:

il _messaggero disse...

Caro Sancho, apenas um reparo: Moita Flores é um independente eleito pelo PSD que preza imensas vezes publicamente a sua independência e certamente não se iria rever na primeira frase que escreveu.

Aliás, ele evoca-a para ter a devida liberdade para poder opinar, falar, elogiar, enfim fazer tudo o que a sua consciência lhe permite fazer, sem ter qualquer constrangimento partidário.

No entanto, passando por cima da dialéctica algo maniqueísta que usa no sentido do "nós vs eles" (como se não houvessem bons activos ou pessoas igualmente ponderadas do outro lado da barricada), o seu comentário dá para reflectir sobre a espécie de clubite partidária que tende a grassar nas fileiras dos partidos, e em especial, nos partidos de poder (pelas razões óbvias).

Pessoalmente (e note-se que ainda sou petiz e possuo pouco mais que um quarto de século de vida) surpreendo-me com as sete vidas de muitas figuras políticas que há longos anos saltam de cargo para cargo (muitas vezes fazendo os afamados anos sabáticos em cargos dourados).

O paradigma e o próprio jogo político tem vindo a mudar. Se no pós 25 de Abril, os discursos apaixonados imperavam e cultura do debate realmente importavam e envolviam os cidadãos na vida partidária (pelo menos transparecia isso), com o passar dos anos, tudo isto foi dando lugar a um calculismo e a um paradigma onde a imagem mais que o conteúdo importam.
O dever cívico e a satisfação pelo contributo para uma sociedade melhor, deram lugar ao carreirismo político, ao fim ao cabo reflexo duma cada vez maior individualização da sociedade.
O pior é que isto fez afastar as pessoas comuns ou o cidadão médio da política.

Só para dar um exemplo, há cerca de um ano, quase que por acaso (sessão de mestrado que acabou por não se realizar), assisti a um debate entre líderes e representantes nacionais de juventudes partidárias dos partidos com assento parlamentar, organizado por André Freire no ISCTE - creio que o título era "Os jovens e a política".

Não duvidando da capacidade dos activos dos respectivos partidos presentes naquela sala, estando eu do fundo da sala a observar, pus-me a pensar em todo aquele cenário: na mesa os representantes a se degladiar e atacar mutuamente e na plateia os respectivos correlegionários (muitos dos quais nem assistiram ao debate propriamente dito) a procurarem provocar e espicaçar os adversários na parte das perguntas finais.

Fazendo uma espécie de "offtopic", apenas reforçou uma ideia de Vicente Jorge Silva, com a qual concordo em parte: as juventudes partidárias têm mais vícios que virtudes. Pese apelidadas de escolas e espaços de formação de quadros (admito que o sejam), a grande questão é verificar que na generalidade são organizações ocas, testa de ferro dos partidos para dizer aquilo que não podem dizer, para dar irreverência às campanhas, assim como são em muitos casos espaços onde o carreirismo e os vicíos existentes nas organizações-mãe grassam.

(cont.)

il _messaggero disse...

(...)

Isto leva-me ao ponto que queria focar. A existência de carreirismo que porventura se poderia chamar de carneirismo, dada a capacidade que tem de transformar pessoas em quem até reconheço capacidades, em meras cassetes debitadoras da directrizes e posições dos partidos. A independência, a capacidade de raciocínio próprio ou mesmo a cultura de debate estão a desaparecer, dentro de estruturas que se transformaram em muitos casos em meros veículos de promoção pessoal. E isto é inegável em especial nos partidos de poder. Daí em parte, o cada vez maior desfasamento existente entre a classe política e os eleitores.

Urge reformular rapidamente o paradigma, de forma a envolver o máximo de pessoas (seja nos partidos, seja fora do mesmo em espaços de participação cívica), assim como fazer crescer uma maior consciencialização cívica na população - que manifestamente na generalidade não existe e dá azo à existência de mecanismos que permitem a figuras se perpetuar nos cargos não se sabe como.

Retornando ao tema e pese tudo isto, assim como toda a espécie de clubite partidária existente, é inegável que os partidos são das traves-mestras do nosso sistema político. Assim como é inegável, que mesmo comportando muitos vicíos e desvirtuações (aliás replicadas nas organizações juvenis dos mesmos), são espaços válidos e ainda úteis para o exercício de cidadania, isto num país e numa sociedade que é por norma reactiva.

Daí que tendo em conta tudo isto, os mesmos acabam apenas por ser reflexo da nossa sociedade. E temos de observar que há em todos, elementos mais capazes que outros. Mas os mesmos (ainda que poucos) existem. Em qualquer lugar.


post scriptum: desculpem o longo texto, mas deixei-me levar um pouco tendo que ser obrigado a repartir o mesmo em dois ;)