A votação “no Coelho”, nas presidenciais de domingo, leva a duas ou três conclusões:
- A ideia de que quem “vota no Coelho nunca votaria no PSD” caiu por terra com estrondo, já que muitos dos mais de 45.000 votos no candidato apoiado pelo PND não resultaram apenas da transferência de eleitores que tradicionalmente votam na oposição. A votação parece, de facto, indicar algum descontentamento que atinge eleitores que habitualmente votam PSD, o que deverá levar a que as mudanças propostas por Jardim sejam mais rápidas do que aquilo que o próprio líder estaria a prever. Neste momento, o PSD sente uma ameaça nova, diferente de todas aquelas que já enfrentou porque não utiliza os canais e instrumentos convencionais e tem um discurso muito mais agressivo, muitas vezes semelhante ao da própria maioria. Terá de ser capaz de percebê-lo e encontrar respostas que não se devem ficar por meras operações cosméticas, devendo antes traduzir novos compromissos e mudanças efectivas nas áreas política e económica. Poderá ainda ter de enfrentar um desafio inesperado: para sobreviver, BE e PCP virarão baterias para o PND, mas poderão igualmente endurecer o discurso contra o Governo, procurando de alguma forma seguir as “pisadas de Coelho”.
- Os tradicionais partidos da oposição correm o sério risco de serem “engolidos por um Coelho”. Desde logo o BE e o PCP, mas também o PS. Nunca, em mais de 30 anos de democracia, a esquerda conseguiu congregar tantos votos quantos o candidato apoiado pelo PND . Os socialistas tentarão, como é óbvio, estabelecer “pontes” com o Partido da Nova Democracia, algo que oficiosamente alguns adversários da actual direcção socialista já faziam, mas o grande problema é de legitimidade, ou seja, Jacinto Serrão “ganhou” um partido dividido, provocou rupturas em vez de entendimentos à entrada, não podendo por isso esperar colher grande solidariedade das diversas facções. Não sei até que ponto terá o PS tempo e energia para evitar mais uma catástrofe eleitoral. Quanto ao PCP e ao BE a luta é dramática, pois está em risco a própria sobrevivência dos dois partidos. Se por um lado o PCP tem uma base de apoio que embora pequena poderá ser um conforto numa situação de crise extrema, o BE delapidou, nos últimos anos, a sua pequena falange e dificilmente sobreviverá nas próximas regionais. Deverá endurecer o discurso, tal como o PS e o PCP (que já o fez nas presidenciais, virando baterias, com muito poucos resultados, para Coelho), cercando de alguma forma o PND, mas terá pela frente um ano muito duro. Para já, o BE começou mal, dizendo que a votação no candidato presidencial do PND devia-se simplesmente ao facto de ele ser madeirense…
- Já o “partido de Coelho” tem um desafio que também não será fácil: as expectativas estão mais altas do que nunca e, muitas vezes, chegar ao topo não é difícil, a maior dificuldade consiste em manter-se. Estará no centro do debate político o que, para uma estrutura pequena, pode ter efeitos nefastos. Deverá ser alvo da oposição, que o encarava como “dor de cabeça para o PSD” e que agora o começa a encarar como “enxaqueca” para ela própria. É óbvio que o PND não terá, nas “regionais”, o número de votos que teve Coelho nas presidenciais. É claro que não é, nem nunca será, um projecto de poder. Mas pode fazer mossa e ser parte importante no novo cenário político regional que agora se parece começar a desenhar. Para isso, terá de entender cabalmente o seu papel.
2 comentários:
Óptima análise!
Não será mais 'A ideia de que quem “vota no PSD-M nunca votaria no Coelho” caiu por terra com estrondo' em vez de 'A ideia de que quem “vota no Coelho nunca votaria no PSD” caiu por terra com estrondo'.
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