Porque todos nós começamos a ficar fartos da política e dos políticos, hoje escrevo sobre um tema que gera paixões e divide profundamente e legitimamente a sociedade portuguesa: o aborto e o referendo que se aproxima (isto é, caso o Presidente da República decida convocá-lo).
Até ao momento, tenho visto os defensores do Sim à pergunta do referendo alegarem 4 razões fundamentais para justificarem o seu voto.
a – são as mulheres que mandam no seu corpo;
b – é uma vergonha mulheres serem julgadas por praticarem ou serem sujeitas a um aborto;
c – as condições deploráveis a que algumas mulheres se submetem;
d – famílias e mulheres sem condições para educarem uma criança.
Alguns defendem apenas uma, outros defendem várias e outros, menos cuidadosos, defendem todas.
Eu voto Não. Como sei bem que os defensores da liberalização (é disso que se trata, deixem-se lá de eufemismos) não estão interessados nas minhas razões, e como também sei que mesmo que as ouçam, não as valorizam, vou apenas dizer porque não concordo com os argumentos pelo Sim.
a) Vociferem o que quiserem vociferar os movimentos feministas mais apaixonados e mais ou menos radicais, mas jamais aceitarei discutir com base de que no corpo das mulheres mandam elas. Um embrião não é um apêndice do corpo feminino. As mulheres que disponham como quiserem do seu aparelho reprodutivo, mas nunca lhes reconhecerei o direito de disporem de um embrião. Porque um embrião é uma vida, numa fase que ainda compreendemos pouco, mas que não deixa de ser uma vida. Não sou eu que o digo, é o dr. Gentil Martins.
b) O argumento de que é vergonhoso mulheres serem julgadas também está enfermo de falácias:
1.º - um dos casos mais mediáticos foi o de uma mulher de Setúbal, que fez um aborto aos seis meses. Ora, caso a liberalização (insisto) tivesse sido aprovada em 1998, a sra. teria sido julgada na mesma. Para além disso, perdoem-me, mas abortar voluntariamente aos seis meses não me parece defensável racionalmente. Qual é o argumento?
2.º - quando uma mulher fizer um aborto, recorrendo aos antigos métodos, às 11 ou 12 semanas, como é que vai ser? Serão essas mulheres julgadas? Continuaremos com essa vergonha? O que é que a alteração da actual lei irá mudar?
c) Este é um dos poucos argumentos a que sou sensível. Não conheço nenhum local onde pratiquem abortos. Nunca tive que recorrer, mas não me parece que aquela ideia que a Dra. Odete Santos defende, de abortos feitos com agulhas de tricotar, tenha alguma relação com a verdade. Com tantos medicamentos abortivos, de venda livre, que existem no mercado, não sei se continua a ser necessário agulhas que estraçalhem os fetos. A realidade continua a ser hedionda e brutal, mas acredito que sem esta ficção demagógica.
O não quer dizer que os abortos sejam menos perigosos. But, then again, qualquer aborto está envolto no perigo, que não sei se diminui por ser feito num hospital público. Realço ainda o facto de que estes párias continuarão a existir, uma vez que continuará a haver clientela (gravidez com mais de 10 semanas).
d) Este é um argumento complicado: o que são consideradas condições adequadas para criar uma criança? Os meus pais nunca foram ricos e criaram 6 filhos. Conheço pessoas ainda mais pobres que também educaram os seus filhos, com, amor, carinho, e sem que lhes tivesse faltado qualquer bem essencial. Por outro lado, sabemos que o mundo é volátil e as minhas condições financeiras de hoje, poderão não ser as de amanhã. Em relação ao abandono de crianças, sejam honestos e digam lá: acreditam que o mundo vai passar a ser um lugar melhor para as crianças? Que estas terão mais amor e melhores condições? Que vão deixar de haver os abandonos, os maus tratos? Acham mesmo que a miséria vai desaparecer? Ou, sequer, que as crianças irão desaparecer da miséria?
Reconheço que a questão é complicada. Mas sinceramente não revejo qualquer peso aos argumentos apresentados. São demasiado falaciosos. Ainda assim, continuo aberto à discussão. Argumentem! Afinal, também é para isso que os blogs servem.
16 comentários:
Cala-te que tens pila e não percebes nada disto. No meu corpo mando eu.
Eu voto sim.
Porque o aborto existe.
Porque um embrião aínda não é um ser humano (apenas o é em potencial).
Porque os casos de aborto efectuados sem condições representam um custo enorme tanto para o serviço nacional de saúde como para as próprias mulheres, que ficam muitas vezes iremediavelmente afectadas fisica e psicologicamente.
Porque pior que uma criança nascer e crescer no seio de uma familia sem condições é viver com uma familia que não a deseja.
Na minha perspectiva, nem devias ter que votar. Evocam coragem política para umas coisas e falta-lhes tanta em relação a outras...
Quanto ao meu voto é pelo SIM, como é óbvio (para quem me conhece). E como sabes, já vociferei (vocifero e continuarei a vociferar) algumas máximas feministas aqui e ali. Neste momento, só espero que ainda não tenhas tratado das burocracias inerentes à mudança de residência... ;)
Conversamos a sério sobre isto quando estivermos juntos, a fim de podermos vociferar alegremente. E palpita-me que aí terei aliadas...
WOAB,
claro que vociferemos, em breve, alegremente. Quanto às aliadas, não sei bem se terás razão. Mas isso veremos!
Sancho Gomes
Eu voto sim. E voto sim por duas razões bastante simples - digo isto por uma questão argumentativa, não para mudar a opinião a ninguém, até porque acho que isso é bem difícil no que este assunto diz respeito -, Portugal vai andar nisto enquanto o sim não ganhar; e porque entendo que quem quiser fazer um aborto, fá-lo-á dê por onde der - com agulhas, ferros ou comprimidos -, por isso, mais vale que se dê condições para que essa decisão custe o menos possível à mulher que carrega o feto. Talvez pense assim, porque já foram encontrados dois fetos (já grandes), nos caixotes do lixo na zona onde moro, mas o que é que isso conta.
Tino: você alega algumas razões par votar sim. São as suas razões e respeito, mas permita-me discordar de algumas delas:
“Porque o aborto existe”.
Este não me parece ser argumento. Porque o assassínio também existe, e não é por isso que o vamos legalizar, pois não?
“Porque um embrião aínda não é um ser humano (apenas o é em potencial).”
Antes de mais, o que define um ser humano, filosófica e biologicamente?
Mas dou de barato e aceito o seu argumento.
Repare, se para si o embrião não tivesse qualquer importância, fosse desprovido de toda a humanidade, não se referiria em termos de ser humano, mas de vida. Ora, o Tino não retira esta humanidade ao embrião, porque efectivamente não entende o embrião como uma coisa. Mais, em termos filosóficos rigorosos, a potência é já ser. O que é em potência, já o é efectivamente.
“custo enorme tanto para o serviço nacional de saúde”
Não vou entrar no absurdo de afirmar não saber qual será o custo dos abortos feitos no hospital, caso a lei seja alterada, porque para mim, esta não é uma questão económica.
“Porque pior (...) é viver com uma familia que não a deseja”
Tomemos um exemplo concreto: x tem 16 anos, está grávida, o namorado diz que não quer ter nada a ver com a gravidez e os pais de x também não querem ser avós. Todavia, x não tem dinheiro para fazer um aborto em Espanha e os seus pais também não querem que a sua filha vá para as mãos de um talhante, pelo que optam pelo nascimento da criança.
X e os seus pais são cidadãos normais, sem qualquer tipo de psicose.
Tem assim tão pouca fé no Homem para achar que esta criança será maltratada e não será amada, apenas porque não a puderam matar enquanto ainda estava no útero da sua mãe? Acha que x e os seus pais não a amarão de qualquer forma?
WOAB:
“Na minha perspectiva, nem devias ter que votar. Evocam coragem política para umas coisas e falta-lhes tanta em relação a outras”.
Pois, eu não reconheço lá muita coragem política este governo PS, mas parece-me que neste aspecto, andaram bem. Qual é a legitimidade que uma Assembleia teria para legislar sobre uma matéria em que o povo foi ouvido apenas há 8 anos atrás? Como justificar isto politicamente?
Como sabes, eu sou um apologista da democracia participativa e o referendo é uma ferramenta fundamental para este conceito. Poderás dizer que há 8 anos o resultado não foi vinculativo, porque a maioria não votou. Ora, mas votaram aqueles a quem a questão dizia alguma coisa. Havia três posições: os que achavam que a lei deveria mudar, os que achavam que não e os que não tinham opinião/não se interessavam. Os que não votaram, apenas disseram que para eles dava na mesma, contando os que votaram. E nestes, a maioria votou Não. Por outro lado, numa matéria de consciência moral e ética, acho que os portugueses deverão ser sempre ouvidos, porque os deputados não estão mandatados para alterarem conceitos morais. Nestas matérias, o legislador deve ter sempre em conta o paradigma moral vigente no país para onde legisla. E nesta matéria, apenas auscultando a população é que se poderá determinar qual é o paradigma. Por isso, apesar de ser radicalmente contra, estou preparado para aceitar o Sim, mesmo que o resultado não seja vinculativo.
Marco:
“mas o que é que isso conta.”
Conta muito. Mas, choca-o encontrar um feto num caixote público, ou o facto de se fazerem abortos? É que caso a lei seja alterada, os fetos irão continuar a ser deitados no lixo, só que desta vez no ambiente asséptico dos resíduos hospitalares, para depois serem queimados. Longe da sua vista, é certo, mas nem por isso menos chocante.
Amigo Sancho
Vejo que os ares do Alentejo, ao contrário do que seria de esperar com a sua história de luta anti-fascista e de coragem, não te contagiaram. Pelo contrário, a planície avivou uma costela conservadora que não estava bem definida. Mas nisto da opinião, só não respeito quem não a tem e nesse grupo tu não te arriscas a entrar.
Agora, passando à questão do aborto, começo por deixar claro que, como no primeiro referendo, vou votar "sim". Mesmo que considere - como escrevi há oito anos - que esta é uma questão em que as mulheres deveriam ter uma opinião (voto) muito mais valorizada do que os homens. Por mais que venham com aquela conversa de que o pai também tem direito a decidir e sei lá mais o quê.
Também é verdade que só por falta de coragem política de António Guterres é que o país se meteu nesta confusão. O PS tinha toda a legitimidade, em 1998, para apresentar uma proposta de lei e votá-la na Assembleia da República. A democracia directa é muito bonita, mas os dois referendos já realizados (aborto e regionalização) - "perdi" nos dois! - mostraram, com a abstenção vergonhosa que se verificou, que os portugueses (como a maioria dos europeus), preferem que sejam os deputados a decidir.
Argumentos para votar "sim":
- ninguém tem o direito de OBRIGAR uma mulher a ter um filho! Há países, como a Irlanda, onde até as mulheres vítimas de violação não podem abortar. Isto é pior que a Inquisição da Idade Média;
- os mesmos que se batem contra o aborto, por razões religiosas, opõem-se ao planeamento familiar alargado, aos preservativos nas escolas e tudo o que se pareça com "sexo sem o fim da reprodução"; Será que só fazem sexo para ter filhos?... Uma boa pergunta...
- as razões económicas são reais para justificar o aborto, principalmente nos casos de mulheres com vários filhos e que vivem em condições abaixo do limiar da pobreza;
- o aborto vai existir sempre, mesmo que o "sim" não passe. As abortadeiras vão continuar a ganhar dinheiro, as clínicas vão continuar a cobrar pequenas fortunas (já ninguém vai a Espanha!) e todos continuaremos a viver na hipocrisia do costume;
- pego num dos teus argumentos: consideras razoável que uma adolescente de 14/15 anos passe pelo trauma de uma gravidez e de um parto?
- tudo isto mudava de figura se no lugar de "interrupção voluntária da gravidez" escrevessem "desmancho". Até a minha avó votava a favor, porque ... desmanchos toda a gente faz...
Havia muito mais a dizer, mas fica para segundas núpcias...
Um grande abraço
Jorge Freitas Sousa
Caro Jorge Freitas de Sousa
Tomar parte de uma decisão politica exige mais do que manifestar apenas a nossa opinião. Exige moderação. Requer uma atitude proactiva, de busca do conhecimento, de espírito aberto, disponível a ouvir ambas as posições. Sem ideias predefinidas.
Considero também uma atitude de franca humildade reconhecer quando temos dúvidas…e não conseguimos defender uma posição sobre questões de extrema complexidade. É o meu caso sobre actual proposta de despenalização da IVG.
Partimos dos seguintes pressupostos:
1. Ninguém realiza um aborto de ânimo leve, quando o faz é por fortes motivos.
2. Nenhuma mulher deve ser condenado por realizar aborto.
3. O aborto não é nem pode constituir um acto de planeamento familiar.
Você coloca no centro a mulher, mas esquece o feto, que é uma vida. É verdade que depende de outro Ser, mas não diminui a sua condição de Ser.
Discordo de si noutras questões. Penso que o homem tem os mesmo direitos, ou mesmo poder de decisão, que uma mulher. Ao atribuir maior poder de decisão à mulher, não pondera o papel do homem enquanto Ser gerado pela mulher. Você coloca-o apenas enquanto progenitor.
‘’Ninguém tem o direito de OBRIGAR uma mulher a ter um filho!’’ refere, discordo. Considero sim que perante condições desfavoráveis dos progenitores, o Estado deve assumir maior protagonismo, não deve pois desresponsabilizar-se das suas funções. Deve reforçar mecanismos de suporte à vida, maior intervenção no planeamento familiar, agilizar os processos de adopção, etc., imaginário?
Os principais argumentos do sim, sustentam-se nas dificuldades financeiras dos progenitores, o desfazer dos planos de vida destes, falta de oportunidades e um potencial criminoso que está por nascer…Será mesmo verdade? Quantos de nós não esteve para seguir esse ‘’caminho’’?
É preciso ouvir os que trabalham com crianças que foram negligenciadas pelos pais, quer de forma voluntária ou involuntária, por motivos socio-económicos.
Uns tempos trás li uma entrevista de um director de uma casa de acolhimento de crianças desfavorecidas. Dizia ele que ‘’quem não quer uma criança, que nos entregue, nós cuidamos’’. Esta posição é negligenciável?
Caro Sancho vota não, porque razão especificamente.
Porque entende que as mulheres que praticam aborto DEVEM IR PARA A PRISÂO?
Porque entende que um casal não deve ser livre de decidir quantos filhos quer e pode ter ?
Porque entende que uma lei pode ser discriminatória, e por razões económicas só é aplicada ás mulheres dos extractos mais baixos da população, dado que as outras, têm sempre um médico amigo, ou uma clinica privada,em PORTUGAL ou em Badajoz, disponivel, para uma resolução do problema, sem quaisquer riscos, mesmo os de caracter legal...
Ou porque a sua MISOGINIA o faz odiar assim tanto as mulheres.
Eu voto SIM , porque entendo que a lei actual tem de ser modificada, porque é discriminatória, e já não tem em conta a realidade dos tempos presentes.
E como cidadão de um PORTUGAL REPUBLICANO E LAICO, entendo que as leis , devem acima de tudo, defender o bem publico e a necessária igualdade entre cidadãos, não devendo por isso submeter-se a ditames religiosos, ou a pseudo principios morais ou éticos, quando eles sejam o posto da defesa da saude publica, como é este o caso.
Desta vez começo peço fim.
Caro(a) Pacheco, não me confunda. Eu não tenho qualquer aversão às mulheres. Por outro lado não sei que textos leu, mas se dos meus infere que eu sou misógino, das duas uma: ou não percebe patavina de português, ou tem alguma dificuldade de compreensão.
Naturalmente o teor do seu comentário não deveria merecer resposta. Mas porque você faz afirmações graves, desta feita irei responder à sua tentativa de agressão.
1º A questão da prisão é uma falácia. Porque mesmo que o Sim vença, as mulheres que abortem depois das 10 semanas continuarão a ser julgadas.
2º
Você afirmou: “Porque entende que um casal não deve ser livre de decidir quantos filhos quer e pode ter?”
Repare que esta sua afirmação é ela toda reveladora que para si o aborto é uma forma de contracepção. E para mim, entender o aborto como uma prática contraceptiva é não ter qualquer respeito pela dignidade humana e muito especialmente pela dignidade feminina. Porque qualquer aborto, seja ele feito em melhores ou piores condições, é sempre uma violação à dignidade feminina.
Por isso, quando fala em liberdade, entendo que está já subvertida, uma vez que a liberdade coloca-se antes da gravidez. O direito está a montante (liberdade), o dever (responsabilidade pelos seus actos) a jusante. Porque a partir do momento em que a mulher engravida, não se trata apenas da vida de duas pessoas, mas de três.
3º Você acha mesmo que um abortozinho em Badajoz não traz qualquer inconveniente à mulher? Que não existe, aí, qualquer risco? Sabe, são argumentos como esses que retiram força às razões legítimas dos movimentos pelo Sim.
4º “(...)não devendo por isso submeter-se a ditames religiosos, ou a pseudo principios morais ou éticos, quando eles sejam o posto da defesa da saude publica, como é este o caso. “
Do alto da sua presunção, assume como “pseudo princípios” um complexo sistema axiológico que defende a vida intra-uterina. Argumentos de peso, não haja dúvida!
Por outro lado, fala de princípios éticos que, no seu entender, são opostos à defesa da Saúde Pública. Não percebo: o que é que na defesa da vida intra-uterina pode ser atentatório à Saúde Pública?
Jorge,
Bem-vindo companheiro. Há algum tempo que não "te lia" por aqui.
Discordo, como deves calcular, dos motivos que te fazem votar pelo Sim. Mas haverá oportunidade para discuti-las melhor (até porque o Cláudio Torres já enumerou algumas das razões partilhadas por mim). Em relação à tua afirmação sobre o referendo, será matéria para um outro post.
Um abraço,
Caros C. Torres e Sancho
Uma das vantagens deste blog - um dos únicos que frequento - é a possibilidade de trocar ideias de uma forma adulta, algo muito raro numa blogosfera cada vez mais "sem lei" e com espaços onde o insulto e o crime de difamação são a regra, protegidos pel aausência total de legislação. Parabéns.
Passando à resposta,
Para mim é óbvio que no centro desta questão está a mulher e aqui deve residir a grande diferença das nossas opiniões. Considero que este problema é, antes de mais, um diálogo entre "direitos" de opção. Para mim é um direito exclusivo da mulher decidir e por isso considero necessário reajustar a nossa lei que já não é tão atrasada, como os apoiantes mais radicais do "sim" querem fazer crer.
Como escreveu o C. Torres, é mais do que óbvio que nenhuma mulher utiliza o aborto como forma de planeamento familiar. Embora sem conhecimento (óbvio) de causa, penso que deve ser uma situação complicada e até traumática, pelo que só deve constituir uma derradeira opção. Mas deve ser uma opção!
Quanto ao "voto na matéria" do pai, ou do pretenso pai, parece-me mais do que discutível que alguém possa obrigar outra pessoa a ter um filho que não deseja. Acredito que nenhum dos dois seria capaz de obrigar a sua companheira a ter um filho indesejado, alegando apenas o "direito do pai". Talvez viesse a ser pai mas provavelmente deixava de ser marido ou companheiro... Além disso a maior parte dos "pais" envolvidos nestas situações são ilustres anónimos ou "desaprecidos em combate".
Essa questão das "três vidas" é muito rebuscada, porque raramente o "terceiro" cumpre as suas responsabilidades. Embora este argumento seja irrelevate para o meu voto "sim", porque mantenho que é, apenas, uma questão que diz respeito à mulher e à sua consciência.
Quanto à discussão sobre a vida intra-uterina, num feto com um máximo de dez semanas (dois meses e meio), parece-me uma questão puramente filosofico-religiosa, embora os radicais do "não" - nenhum dos dois entra nesse grupo - espalhem cartazes com fetos de oito meses e digam que "vão matar o Joãozinho!"
O que acho curioso em toda esta discusssão - em oito anos nada mudou - é a grande partidarização do referendo. Sinceramente não me interessa minimamente a opinião de qualquer político sobre esta matéria, nem de lideres religiosos. Por isso, prometi a mim mesmo que não veria nenhum tempo de antena antes de votar. Vou limitar-me a este blog que merece mais respeito.
Um abraço
Desculpem, o comentário anterior não foi assinado
Jorge Freitas Sousa
Antes de mais, eu ainda não faço ideia se voto sim ou não, ou sequer se vou puder votar fora da Madeira, pois em principio não estarei na Madeira.
Mas tenho algumas dúvidas:
1) Num país em que temos que ter políticas natalistas, vamos legalizar o aborto?
2) Legalizado ou não o aborto vai continuar a existir não é?
3) A irreponsabilidade de alguns rapazes e raparigas será pago pelo Estado Português? Ou então simples capriches ou vontades de não querer ter filhos e ter a possibilidade de terem...
4) Falam muito no meio social e como vão viver... digam-me uma coisa essas pessoas que ficam gravidas nesses meios, terão "pachorra" para fazer o aborto? Não vão preferir receber o abono?
Eu tenho mais perguntas, mas gostava que os defensores do sim e não argumentassem... :)
Como médica e mulher, não poderia ser mais favorável à despenalização do aborto, e que vença um SIM esmagador no referendo.
Não está em causa a realização do aborto, pois a prática do aborto, independentemente dos motivos, sempre existiu e sempre existirá!!
O que está realmente em causa é a realização do aborto em meios assépticos e adequados, dignos e acessíveis a qualquer mulher, e não só às mulheres que podem pagar uma clínica em Espanha ou no Reino Unido. Claro que, do outro lado da barricada, existe a prática ilegal do abordo em condições deploráveis e verdadeiramente terceiro-mundistas, conduzindo a graves sequelas físicas e psicológicas nas mulheres que o fazem. Relembro que estima-se que anualmente morram 68 mil mulheres pela prática do aborto em condições precárias, a maioria destas mulheres jovens!
Está na hora de deixar o provincianismo para trás e abrir os olhos!
Em 2/3 dos chamados países desenvolvidos a prática do aborto, quando solicitado pela mulher, é legal e possível. Pelo contrário, apenas 1 em 7 dos chamados países em desenvolvimento permite a prática do aborto quando solicitada pela mulher.
E nós? Onde que nos colocamos no mapa?
http://ordemparanaoreanimar.blogspot.com/
Jorge,
Ainda bem que te sentes bem por “cá”, pois para mim também é gratificante ter frequentadores inteligentes e críticos como tu.
Antes de mais a discordância: não acho que a questão da vida intra-uterina seja filosófico-religiosa, mas filosófico-biológica. A religião, se entrar nesta discussão, entrará sob a forma ética (no sentido de sistema de valores religiosos) que é tão válida quanto qualquer outro sistema ético. Portanto, admito que as religiões tenham alguma coisa a dizer sobre isto, mesmo que não concorde com os argumentos.
Percebo o teu argumento sobre a decisão da mulher e acredita que sou sensível a ele (apenas porque não colocas a questão como um direito sobre o corpo, mas como uma decisão sobre a maternidade). Aceito que na maioria dos casos o elo masculino seja um qualquer cobarde anónimo. Todavia, para mim, é uma questão de princípio porque, como já te disse, entendo que a vida inicia-se no momento da fecundação. Do ponto de vista ético poderá colocar-se a questão do primado da vida e sua hierarquização, isto é, qual é a vida mais importante: a da mulher ou a da futura criança? E também a esta questão não tenho uma resposta definitiva. Todavia, acho que tratando-se da legislação, o caminho a percorrer deverá ser sempre na tentativa de aproximação ao ideal. Fazendo as devidas ressalvas, coloco-te aqui um exemplo: todos nós compreenderíamos um pai que matasse um pedófilo apanhado em flagrante delito a violar um seu filho. Seria perfeitamente legítimo, e moralmente aceitável (porque eu dou o primado da vida a uma vítima, sobre um energúmeno pedófilo). Mas seria aceitável que a lei dissesse que, nestes casos, não haveria pena para o homicídio? Eu acho que não e é pela mesma razão que votarei Não.
Em relação à partidarização: subscrevo tudo o que disseste!
Baby boy,
Percebo as suas dúvidas. Os argumentos espalham-se ao longo dos textos que têm sido escritos.
Reanimadora,
Diz que morrem anualmente 68 mil mulheres pela prática de aborto em condições precárias. Sabe me dizer qual a é a percentagem desse número de mulheres cujos abortos são feitos até às 10 semanas? É que parece-me que, a ser verdadeiro esse número, não sofrerá grandes transformações mesmo que a lei seja alterada.
Adjectiva de cegos e provincianos os que discordam de si. Acho que é desnecessária a ofensa. Tem algum “valorómetro” que nós desconheçamos? Seja guerreira pela sua causa, mas não seja pretensiosa ao ponto de achar que os “outros” são “provincianos” e “atrasados”, apenas porque discordam de si. Porque em verdade todos os outros argumentos são tão válidos quanto os seus. Por muito que isso lhe desagrade!
Creio que fui mal interpretada;
Cito novamente a frase que escrevi: «Está na hora de deixar o provincianismo para trás e abrir os olhos!»
Apenas me referia à legalidade inequívoca da prática da interrupção voluntária da gravidez na maioria dos países ditos 'desenvolvidos', em oposição ao que se verifica nos ditos países 'subdesenvolvidos'.Apenas questionei em que lugar nos situariamos no mapa.
Continuaremos nós na cauda da Europa???
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