"Reúne sete ou oito sábios e tornar-se-ão outros tantos tolos, pois incapazes de chegar a acordo entre eles, discutem as coisas em vez de as fazerem" - António da Venafro
2.10.07
O inenarrável futebol português
Enquanto uns se entretêm a falar de arbitragens, esquecendo-se confortavelmente dos jogos em que são beneficiados, o futebol português mergulha numa espiral quase sem retorno. Não me lembro de um arranque com tanta falta de qualidade, de emoção e de golos. Chegou-se ao ponto em que ver um filme do Oliveira ou assistir a um jogo com o Boavista são boas medidas contra a insónia e a certeza de uma plateia deserta.
Em Portugal, as derrotas ou os empates inesperados são sempre justificados com os erros da arbitragem, como se fosse possível absolver os restantes intervenientes das suas responsabilidades. Os jogadores nunca são maus, os dirigentes são sempre os melhores do mundo, os treinadores uns sábios de eleição que vêem a sua imbatível táctica esbarrar no homem do apito e noutras forças ocultas. A mediocridade infelizmente tomou conta do futebol tuga e tornou-o um desporto demasiado caro para o triste espectáculo proporcionado. Seja a que preço for.
Olhem bem para as transmissões televisivas do campeonato português e perguntem-se como é possível que equipas como o Boavista, o Paços de Ferreira, a Naval, a União de Leiria, o Leixões ou mesmo a Académica militem na primeira liga? Como é possível que treinadores como Jaime Pacheco, José Mota ou Paulo Duarte tenham carteira de treinador se visivelmente as suas equipas são a antítese do futebol? Eu sei que parece radical, mas nós, enquanto público, não podemos engolir tudo o que nos oferecem, apenas contentes com o facto do nosso clube ser campeão ou simplesmente ficar na primeira liga. A nossa conivência tem muito que se lhe diga e é cúmplice da situação instalada. E nós, novamente enquanto público, temos de ser os primeiros a exigir: a exigir qualidade, a exigir emoção, a exigir espectáculo, a exigir golos. Tal e qual como o fazemos quando assistimos a eventos de outra natureza. Quando estes pressupostos se encontrarem reunidos, teremos mais gente nos estádios, maiores audiências televisivas, mais publicidade e receitas e mais dinheiro disponível para investir em melhores jogadores e treinadores.
Eu não quero apenas dois ou três clubes a jogar à bola. Quero que todos, pelo menos, lutem pela vitória, que procurem o golo, que não vivam obcecados à frente da baliza. Eu quero que no fim dos jogos, os jogadores fiquem estafados e o público cansado, não da monotonia, mas do ritmo louco imposto por uma bola que não parou de mexer.
Enquanto isso não acontecer, os árbitros continuarão a ser os únicos responsáveis pelo actual estado de coisas, já que os dirigentes passam impunes, os treinadores mudam de clube e os jogadores se limitam a cumprir as instruções de técnicos fracos, cujo único horizonte é uma tabela classificativa.
Que alguns nos queiram permanentemente atirar areia para os olhos é uma coisa; que o povo do futebol, se limite, sonolento, a esfregar os olhos, é outra. E bem diferente.
PS1: apesar dos erros, não tenho nenhuma dúvida de que Pedro Henriques é o melhor árbitro português.
PS2: em 48 jogos já disputados, registaram-se 22 empates na primeira liga, sendo a maioria deles a zero ou a um. Num outro patamar, em 48 jogos, marcaram-se 92 golos o que perfaz uma média inferior a dois golos por jogo. Sintomático.