9.1.06

Centralismo e centralistas

O presidente da Câmara da Calheta veio recentemente falar sobre a Casa das Mudas. Para dizer, basicamente, que os críticos da localização do Centro das Artes são uns "centralistas".

Os argumentos foram os clássicos:

- a Calheta fica a 20 minutos do Funchal (e já agora, de autocarro a quantos horas fica?)

- Os "intelectuais d0 Café do Teatro" (a designação não é má, é repetitiva) são centralistas.

- O número médio de pessoas que visitam as exposições na Casa das Mudas é mais alto do que o número médio de visitantes das exposições que se realizam no Funchal.

- Por último, deu o exemplo de Bilbau. O mais óbvio quando se discute estas coisas, esquecendo-se de que Bilbau é a capital de uma província espanhola e que tem cerca de 500 mil habitantes e que fica na "encruzilhada" de dois países, França e Espanha (três, se quisermos contar com Andorra) e que tem um Aeroporto Internacional maior que o da Madeira.

Pois é. A Calheta fica a "20" minutos do Funchal. Mas será que o Funchal não fica a "20" minutos da Calheta? As vias-rápidas só estão abertas num sentido?

Centralismo e centralistas? Falar em centralismo numa terra com 200 e tal mil almas e com meia dúzia de quilómetros quadrados e com boas acessibilidades é, no mínimo, rídiculo!

O número médio de visitantes é superior. Isto é factual ou faccioso? Há estudos que o comprovem ou é o "olhómetro" a funcionar?

É inegável que a Casa das Mudas tem qualidade. Mas é também inegável que está no sítio errado. Porque a esmagadora maioria da população da Madeira vive, essêncialmente, em quatro concelhos, Funchal, Santa Cruz, Machico e Câmara de Lobos. E porque 90% da população flutuante (leiam-se turistas) da Região está nesses mesmos concelhos. E numa época em que, em todo o lado, se fala em facilitar o acesso à cultura, aqui colocam-se obstáculos.

Nem se pensou, por exemplo, em criar uma linha de "shutle-bus" para a Calheta. Em facilitar a vida a milhares de madeirenses que não têm transporte próprio (exemplo máximo são os estudantes do secundário, que se vêem privados de ver as exposições e os espectáculos, a não ser que as escolas organizem "passeatas", o que a a acontecer, acontece uma vez por ano).

A questão da localização não é de somenos importância. É fundamental quando se pensa na implantação de bens culturais. Particularmente numa ilha onde é fundamental (a repetição é propositada) promover o acesso à Cultura.

Por último, ninguém duvida que o arquitecto Ricardo Velosa tem competência mais do que suficiente para liderar o aprojecto. É um homem sério e profissional. Que tem imprimido alguma dinâmica ao (s) espaço (s), faltando apenas, na minha opinião, investimento na área de comunicação. Ninguém questiona a capacidade de "sonhar" de Luís Guilherme, um homem admirável. Por isso, colocar as coisas nos termos em que, por vezes, são colocadas, é mandar areia para os olhos das pessoas. Questiona-se a localização da infraestrutura. Só isso. E já não é pouco.

Ninguém quer que a "coisa" venha abaixo. O centro de artes foi aberto na Calheta e por lá deve ficar. Mas dizer que está tudo bem é persistir no erro. É necessário "aproximar" o Casa das Mudas dos maiores centros urbanos. E isso só é possível com alguma criatividade. Que não tem estado patente nos últimos discursos sobre o assunto. Já agora, era bom que se tentasse não reduzir a Cultura a uma qualquer "guerra" de protagonismos.