30.6.06

Um serial killer lusitano

Santa Comba Dão, terra pacata do ditador, produziu recentemente o nosso mais novíssimo serial killer. Absorvidos e hipnotizados pelas séries televisivas, os portugueses seguiram com alguma atenção e consideração os meandros dos crimes e o seu respectivo deslindamento. O empreendimento prometia. E assegurava algum desvio de atenções numa época de hipnose futebolística que ultrapassa os próprios limites do jogo: as suas quatro linhas. Talvez inspirados pelo CSI ou por uma qualquer série americana, muita gente se desfez em explicações e em considerações que avançavam, em algumas situações, com as teorias mais abstrusas. Contudo, o método seguido pela Polícia revelou-se acertado e trouxe frutos: ou seja, capturou o serial killer. Mas reconheçamos que o serial killer nem era nada de especial. Nem muito original, o que fará dele uma espécie de imitador barato. Já o John Doe (Kevin Spacey) do David Fincher (Seven) tornou-se conhecido por virar o pecado contra o pecador, executando-o de seguida com alguns requintes de malvadez. Mas o que mais espanta é a dificuldade em se lidar com o problema e a evidência da maldade humana, arranjando mil e um subterfúgios para ignorá-la ou simplesmente jogá-la para debaixo do tapete. Muita gente crê no positivismo de Comte. E acredita que a sociedade perfeita gerará homens perfeitos, limpos e puros, incapazes de qualquer atrocidade. Isto pressupõe que os crimes hediondos que por aí pululam só podem ter uma de duas explicações: ou são resultado de uma origem social de miséria ou são resultado de uma manifesta insanidade mental, momentânea ou permanente, o que é indiferente. Como é notório, qualquer uma das explicações tenta desresponsabilizar o acto do suposto “pecador”, passando o ónus da culpa para a sociedade que nos acolhe ou para o cérebro recalcado. Ou seja, desresponsabiliza-se individualmente para, em parte, responsabilizar-se colectivamente. Mas estas explicações são simplistas porque procuram precisamente... simplificar. A maldade humana infelizmente existe e existe muitas vezes bem perto de nós. Lembrem-se de monstros conhecidos como Estaline, Mao ou Hitler e percebam que o género humano não é propriamente conhecido pelo seu amor ao próximo. E que ainda há sessenta anos atrás um povo tido como culto ouvia música clássica de manhã e exterminava gente à noite. E que o vizinho alcoólico que bate diariamente na mulher não passa muitas vezes de uma besta que usa a violência apenas para magoar os outros. Ou será que já não acreditamos que as pessoas não sabem distinguir o bem do mal?