Junto um extracto da minha intervenção onde estão patentes algumas ideias, ainda que soltas, sobre caminhos a seguir:
"Seria bom assentar uma premissa de base, um princípio que defendo: o tempo do Estado Providência, o Estado pai, padrinho, anjo da guarda, tutor, tem de acabar. Para além de exaurir os parcos recursos da Região, lança uma cultura de facilitação e de indolência que entorpece e impede a construção de uma sociedade melhor, mais produtiva e mais inteligente. Exige-se muito pouco, nivela-se por baixo. Está difundido o sentimento que o esforço e suor, o trabalhar para atingir objectivos, são conceitos do passado, hoje, totalmente desvalorizados. A inversão deste marasmo, sendo clara, não é simples, mas resume-se à diminuição drástica do direito indeferenciado e generalizado a benefícios, subsídios e apoios e, simultaneamente, o refinamento dos critérios de distribuição.
Esta afirmação não é uma crítica ao que se tem passado nestes 30 anos, era preciso dinamizar a sociedade, puxá-la para níveis de desenvolvimento mais consentâneos com os seus direitos, o fosso, em relação às médias nacional e europeia, era abissal, difícil de transpor. Esta afirmação é a indicação do que deve ser feito a partir daqui, reduzidas que estão as diferenças e de acordo com os novos desafios e dificuldades.
Temos de ser contra uma sociedade que premeia a preguiça e a indolência. Que espera pelos acontecimentos em vez de fazer com que as coisas aconteçam.
A concentração de esforços tem de ser feita, por um lado, nos sectores de actividade com margem de progressão e vitais (turismo, sociedade de informação e comércio), por outro, aqui sim, manter uma intervenção forte e inovadora na saúde e na educação, continuando a dar exemplos, a estar vários passos à frente da estagnação e do imobilismo nacionais.
Em termos de Educação, o nosso calcanhar de Aquiles continua a ser o ensino superior. Esta não é a nossa Universidade, nunca foi. Aquele que deveria ser um dos pilares fundamentais da nossa sociedade, não passa de uma fogueira de vaidades, palco de protagonismos pessoais e com um contributo quase nulo para a nossa evolução. Tem estado, desde o início, arredada dos interesses regionais, teima em virar as costas ao meio onde está inserida, não prepara melhores cidadãos, não desempenha as suas funções.
A continuar assim, não existe alternativa a não ser o seu encerramento. Os danos causados por esta inércia, por esta inexistente estratégia far-se-ão sentir por muitos anos, perderam-se duas décadas, muitos terão sido os responsáveis, de nada vale lamuriar-nos, apenas cerrar os punhos e por cobro a este embuste, agir de forma tenaz e determinada. Tomar conta do nosso destino e afastar-nos deste entorpecimento propositado.
A solução passa por criar a nossa própria instituição, ainda que de raiz privada, com apoio da Região aos alunos sem possibilidades. Um estabelecimento com as valências de bacharelato, licenciatura, pós-graduação, mestrado e doutoramento. Um projecto independente e liberto de todos os elementos castradores que o sistema público impõe. Este sim, é um investimento que vale a pena apoiar, aqui deverão estar concentradas as nossas energias, recursos e esforços. A pasmaceira tem de ser sacudida, ainda por cima quando se assiste a uma deterioração quotidiana e doentia.
Tragam-se verdadeiros mestres, crie-se um centro de excelência, construam-se verdadeiras ligações ao meio empresarial e às instituições regionais. Tracemos o nosso próprio caminho. Busquem-se parcerias com entidades de créditos firmados neste sector, mesmo que estrangeiras, de preferência com estrangeiras. Basta de experimentalismos saloios, de teimosias pirosas e de tonterias supostamente inovadoras.
Outro dos factores críticos de sucesso da Autonomia Regional, passa pela redefinição da Lei de Finanças Regionais, especialmente no tocante à liberdade de determinação de uma política fiscal própria e individualizada. Para captarmos investimento, para cativarmos capital externo, temos de ter capacidade de construir um quadro fiscal competitivo e orientado para esses objectivos. Não podemos continuar agrilhoados a um todo nacional cujas opções não se conformam com a nossa realidade e coarcta o nosso dinamismo. Benefícios específicos, isenções temporárias, taxas escalonadas e diversificadas, características que devem estar sob a nossa alçada e não impostas por uma irrealista homogeneização centralista ou por limites artificiais, símbolos de uma atitude controleira e enfraquecedora.
Para além deste aspecto, a revisão da Lei de Finanças Regionais tem, de uma vez por todas, que garantir que o devedor (neste caso o Estado) honre os seus compromissos, ainda que de forma coerciva.
Temos de combater a existência de pseudo empresas e empresários que, sem um mínimo de preparação, sem qualquer preocupação em construir estruturas empresariais duradouras e aptas a responder às exigências do mercado, polvilham a nossa economia.
Não se podem exigir determinados padrões de qualidade quando se dá guarida a oportunistas sem escrúpulos e a micro barões que pautam a sua acção por práticas de concorrência desleal, não pagando as suas contribuições, não assumindo as suas responsabilidades, usando e abusando da táctica do “toca e foge”. Estas ameaças surgem do exterior mas, cada vez mais, assistimos a investidas que partem do próprio interior da Região.
Esta realidade não dignifica a economia regional, coloca no mercado produtos defeituosos cuja manutenção implicará custos brutais, destrói as capacidades conquistadas pelas empresas que investem fortemente nas suas estruturas e, a breve trecho, causarão implosões desastrosas para a sociedade madeirense.
Se apostamos na qualidade, protejamos as empresas certificadas, se queremos responsabilidade privilegiemos as empresas cumpridoras e se queremos garantias continuemos a confiar naqueles que tantas provas têm dado de dedicação, crença, solidariedade, investimento e criação de riqueza. Aqui, na Madeira, não poderá haver lugar para caçadores de tesouros, mercenários, piratas ou outro tipo de necrófagos, venham de onde vierem, de fora ou de dentro.
Finalmente, temos de conquistar uma outra projecção internacional. Devemos caminhar para uma actuação autónoma, em consonância com a nossa própria agenda e interesses. Devemos estimular uma acção em bloco com as nossas congéneres próximas, refiro-me às Canárias e aos Açores. É tempo de juntarmos as capacidades, energias e os pontos fortes destas realidades e surgirmos nos palcos internacionais como uma força conjunta, nomeadamente na União Europeia. Uma força de 2,5 milhões de habitantes, com um Produto Interno Bruto de cerca de 35000 milhões de euros.
Ao fim ao cabo, estamos mais próximos uns dos outros do que das respectivas metrópoles. As nossas especificidades são comuns e os nossos problemas semelhantes: a distância dos centros de decisão, a ultra periferia acentuada, o isolamento geográfico e as dependências em relação ao exterior.
Em qualquer um dos casos assistimos à subalternização dos interesses específicos, ao sistemático esquecimento e à minoração dos nossos problemas, por parte das administrações centrais.
Esta parceria, esta união deve acontecer a todos os níveis: político, económico, social e cultural. Do desporto à educação, das empresas ao investimento, do turismo ao comércio, da indústria à energia, passando pela cultura e pelos transportes. Não bastam as trocas de experiências, é preciso realizar e construir em conjunto, aparecer como uma realidade própria e com uma identidade definida e individual. É tempo da Macaronésia afirmar-se no seu todo, aproveitar as afinidades geográficas para criar uma referência conjunta."
4 comentários:
Concordo com muito do que dizes, no que diz respeito á lei de finanças regionais e políticas fiscais. No entanto não posso deixar de acrescentar que esse aumento de poder é acrescido de um aumento de risco e de responsabilidade.
Se as nossas políticas forem incorrectas teremos de ser nós, povo madeirense, a assumir esse onus. Não existe verdadeira autonomia sem uma grande responsabilização.
PS - Parece-me impossivél que aínda hoje não se saiba exactamente que receitas geramos em termos de impostos, e se seremos ou não auto-viáveis.
Já pensaste que muita da reacção de Lisboa em relação á Madeira tem a ver com a atitude sindicalista de AJJ e de muita má criação á mistura.
Não vejo a mesma reacção em relação aos Açores, e Carlos Cesár tem conseguido levar a água ao seu moinho.
A autonomia dos Açores não é em nada mais frágil que a da Madeira, e no entanto vivemos como se os barcos de guerra já estivessem no porto do Funchal.
Acho impressionante como é que o PSD ao longo de 30 anos de poder não tenha conseguido gerar um único pensamento alternativo ao do chefe. Algum canário ou açoreano quer lá saber de uma unidade arquipelágica; querem sim uma afirmação das suas autonomias no quadro da unidade nacional que cada vez mais exige, neste mundo globalizado, dimensão, competência e ausência de disparates. Ponham na cabecinha uma coisa: a Madeira não é auto-sustentável. A sua despesa corrente é manifestamente superior à receita corrente. Se o estado português deixar de mandar as transferências o governinho regional não pagava as dívidas que se amontoam ao tecido empresarial. Geraria um ambiente de guerra civil que, isso sim, poria em causa a autonomia conquistada.
O principio que leva uma Europa a comparticipar/subsidiar uma região desfavorecida não é o mesmo que leva um Estado a providenciar os mais carenciados e excluidos?
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