Cara amiga WOAB,
não seria necessário tanto, até porque sei o que pensas sobre a Igreja Católica e sobre o que entendes ser a posição desta Instituição acerca da mulher. Ainda assim, acho que exageraste na dose. O post revela a contundência e impetuosidade que te são características e com que encaras a vida. A violência, contudo, não é habitual. A fotografia do Witkin representaria algum frade?...
Mas como te deste ao trabalho que me elucidar uma vez mais, acho que por uma questão de delicadeza te estou devedor de alguns esclarecimentos. Ou, sem tanto pretensiosismo, de alguma réplica.
Não me sinto digno, preparado ou mandatado para assumir o papel de advogado do diabo – salvo seja! –, o que neste particular significa assumir a defesa da Igreja relativamente às tuas acusações.
Mas seria importante clarificar algumas delas.
Gozas com o encerramento do limbo, mas para uma instituição como a Igreja é fundamental não existirem mal-entendidos, como se revelava esse não-lugar. Apesar do conceito de limbo nunca ter integrado a doutrina católica, fez parte do catecismo (até 1982), sendo um conceito algo obscuro – que de resto foi inventado na época medieval para dar guarida a crianças e justos que, não sendo baptizados, não seriam, todavia, merecedores do castigo eterno do demiurgo (os filósofos também foram para lá atirados por Dante Alighieri, como sabes). Era importante esclarecer que lugar ocupava dentro da doutrina e foi isso que foi feito.
Quanto às criancinhas, a própria Igreja entregou-as à misericórdia divina, não carecendo, portanto, da tua preocupação.
Efectivamente, a Igreja está em dívida para com a Mulher. Secularmente, a mulher foi atirada para um papel menor na engrenagem da Igreja. Apesar da infalibilidade do seu líder relativamente às coisas religiosas, a Igreja foi demasiado imperfeita por não ter sabido dissociar o estatuto sociológico da mulher, da posição que esta seria merecedora dentro da estrutura eclesial. Ou seja, a Igreja foi orientada por homens que lançaram a mulher para o papel que esta ocupava na sociedade, numa atitude pouco conforme aos ensinamentos de Jesus Cristo.
A Igreja é, efectivamente, culpada por se ter deixado enredar nos constragimentos e vicissitudes historico-socio-culturais, não tendo sabido se libertar ou libertar a mulher, conforme aquela que tinha sido a prática de Jesus Cristo, que reconhecia na mulher uma interlocutora igual em densidade ontológica e ética e em capacidade intelectual, como nos diz S. Lucas.
Portanto, reconheço como legítimas algumas das críticas.
Mas seguindo o teu raciocínio, terias que deixar de te afirmar como portuguesa, ou europeia, ou até feminista, porque qualquer uma destas “instituições” está situada num contexto historico-socio-cultural: a tradição judaico-cristã defendeu a sociedade patriarcal, não tendo, portanto, lugar para ti; existem muitas correntes feministas (algumas mais idiotas que outras) e de certeza que não te identificas com todas. Não há, igualmente, lugar para ti. Em rigor, não há lugar para a mulher libertada. Teria que ser inventado assim uma espécie de…limbo!
Quanto ao Espírito Santo profanador do ventre feminino, sinceramente nunca vi onde aqui reside o vector opressivo. A concepção sem pecado não diminui a mulher: engrandece-a, porque o Salvador não tem semente do homem, mas nasce do ventre da mulher.
O pecado original?... Outra invenção de filósofo (desta feita de Santo Agostinho), para impedir que a origem do pecado se situasse em Deus.
Relativamente à galeria de Santas, estas são modelos de virtude e muito poucas são virgens. Aliás, exceptuando Maria, assim de repente não me recordo de nenhuma cujo modelo de virtude seja a sua virgindade. Ainda assim, admito que a Igreja não tenha sabido lidar convenientemente com aquilo que diferencia os géneros. Mas, também isso começa a mudar.
Replicar-me-ias com justeza: mas se assim é, se a Igreja faz hoje esse acto de contrição, porque não emendar rapidamente a mão e repor a integralidade dos direitos que são devidos à mulher? Porque a Igreja padece do pecado da lentidão de processos. É algo inevitável, mas não será no ritmo que a contemporaneidade exige.
Curioso é que algumas mudanças estão à vista e não são propostas de fora, mas derivam de um movimento interno. São as tais que limpam, fazem arranjos florais e ministram catequese que exigem a sua libertação. Num movimento todo ele cristão.
Seres ou não cristã, nada tem a ver com feminilidade. Na minha opinião, tem apenas a ver com essa tua rebeldia irascível que te faz virar contra qualquer instituição.
PS – Perante um tão contundente post, a resposta não poderia ser em forma de comentário, naturalmente.
PS2 - Dispensei-me de preâmbulos elogiosos ao teu texto. Saberás o que me parecerá.
8 comentários:
No que diz respeito à fotografia do Witkin não posso confirmar-te as suspeitas. Falta-lhe a batina. Quanto ao resto, respondo mais tarde.
Não percebo o ênfase que dás à instituição. Movimento de mudança no seio da instituição? Paternalmente acarinhadas com um encolher de ombros. Não será nunca a partir do seu interior que se efectuará uma mudança. A estrutura é demasiado pesada, viciada (e viciosa) para o permitir.
Poderia lembrar-te a consideração que tenho pela tradição judaico-cristã (o que me levaria inevitavelmente à F. B. e afins, não é?). Não consigo seguir completamente o teu raciocínio. O contexto religioso é muito específico, porque em nada, repito, em nada, mudou a forma como se relaciona com o feminino. Quer-se subalterno, de cabeça coberta e de preferência sem voz. Chama-lhe rebeldia irascível, o que quiseres. Mas asseguro-te que não será um capricho feminino.
Ocorreu-me responder exaustivamente ao teu post. Mas a verdade é que estou cansada.
Só um achega: Maria só é "Nossa Senhora", porque deixou de ser Mulher, porque decretou-se que concebeu sem homem, portanto "sem pecado".
Santa ou demónio. Nunca mulher. A concepção sem pecado anula a feminilidade. Só isso.
Quanto às santas, estamos conversados. São modelos de quê? Virtude? E que é isso? Quais são os requisitos para tal epíteto?
WOAB:
sei bem que afirmarás serem apenas iniciativas sem qualquer peso, mas acho que poderá te interessar. Para além disso, sabes que poderás ficar sempre cá em casa e até te emprestamos o carro. Aqui fica a dica: http://www.agencia.ecclesia.pt/noticia.asp?noticiaid=48387
Sobre a feminilidade.. Importar-te-ias de descrever?! É que me parece que o conceito não está assim tão bem definido que não admita Nossa Senhora.
Mas sinceramente gostaria de ouvir a tua definição... Quando estiveres menos cansada;)
Quando cá vieres, em frente a um bom jantar e uma garrafa de vinho, conversamos exaustivamente sobre essa questão. ;)
Quanto ao link:
Não percebi o que há de novo...
E só conversamos quando deixares de lado a minha suposta "rebeldia irascível", como justificação (paternalista?) das posições que tomo. Isso é a falácia do quê? ;)
WOAB,
está vendido. Ao jantar bem regado!
Quando à rebeldia irascível... Paternalista? Nunca, jamais! Sei que tenho essa tendência, mas não contigo:)!
A questão da falácia... Ou isso ou um acto falhado. De quê? Who knows...
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