Nunca durante os meus curtos anos de vida, os meus olham enxergaram tão longe.
Parei no meio de um corredor de um hospital, para esperar que o tempo passasse. Precisava urgentemente de fazer tempo, até poder entrar numa enfermaria.
Foi neste instante brutalmente bombardeado por imagens.
Primeiro passou por mim uma senhora. Ainda tentei sorrir-lhe, mas o olhar dela estava fixo no vazio. Fiquei com a sensação que não me viu.
Instantaneamente encontrei outra cara no fundo do corredor. Dirigia-se tal como a anterior senhora, na minha direcção. Satisfeito por vê-la quase desfilar, em comparação com a primeira, (que mal se arrastava), ainda pensei que poderia dirigir-lhe algumas palavras. Observei-a mais antentamente, mas, no mesmo instante desisti da tresloucada ideia. Vinha contentíssima a mastigar. Parecia uma miúda de 8 anos, a comer uma pastilha elástica.
Fiquei com a certeza de que, também não me viu.
Finalmente pude entrar para o quarto. A porta que dava para o corredor estava
aberta. Era assim que estava quando lá fui a primeira vez. Foi assim que a deixei.
Para quem não está habituado a um hospital, sentia-me resguardado do movimento do agitado corredor.
No entanto, continuei a observar as pessoas a passar. Via agora os perfis dos rostos pálidos. Uns atrás dos outros, passos curtos, deslocavam-se quase sempre no mesmo sentido e ao mesmo ritmo. Da direita para a esquerda, de um fundo para um outro fundo do corredor. Julgo que para verem televisão. Pelo menos existia uma por trás das minhas costas, enquanto estava lá fora. Mais tarde também soube que naquela direcção havia uma casa-de-banho.
O que mais me impressionou não foram as pessoas, foi a ausência de sinais de vida naqueles corpos. A doença lhes roubou a alegria e quase lhes arrancou a alma do corpo.
Angelino Mata Câmara
Sem comentários:
Enviar um comentário