2.2.10

Uma evidência

Em mais um repasto dominical, o Dr. Alegre, em adiantada e precipitada campanha, declarou três coisas: que não é candidato em nome de nenhum partido, que não é candidato para governar e que não é candidato para criar condições para demitir o governo. O Dr. Alegre achou por bem esclarecer a malta quanto aos seus intuitos que, pelos vistos, não resumem nada de tenebroso ou que ponha em causa a vidinha quotidiana da nossa tão estimada pátria.

Não fosse a nossa assumida capacidade para a prestidigitação e não conseguiríamos entender as evidentes entrelinhas de tão brilhante e inesquecível momento. O Dr. Alegre já percebeu que o único partido que por agora o apoia não é o seu e que há muita gente que desconfia das suas verdadeiras intenções quando ele aparece de braço dado com o Dr. Louçã, um profeta para quem a democracia é um notório incómodo. É necessário então que ele diga alguma coisa que descanse as cúpulas que mandam e que não assuste, ou abane, em demasia o sistema.

Mas, e lamentavelmente para o Dr. Alegre, o Eng. (?) Sócrates sabe bem o que a casa gasta e o modo como a política doméstica funciona. É por isso que neste momento esfrega as mãos de contente, perante a rifa que lhe coube em sorte: ao pé do putativo candidato da esquerda, revolucionário imprevisível e cheio de amizades inoportunas, o outro previsível candidato, o Prof. Cavaco, não passa de um conservador moderado com algumas ideias fixas, que o primeiro-ministro não admira, mas que inevitavelmente suporta.

Num tempo já de si incerto, e entre o conhecido e o desconhecido, o Eng. (?) Sócrates já não tem qualquer dúvida e definiu claramente a sua opção: mais vale um Cavaco que dê a mão, que um Alegre em permanente jantar.