Desde há algumas décadas que os intelectuais europeus, influenciados pela escola estruturalista francófona, têm laborado no erro de identificarem as várias doutrinas - do que se convencionou chamar - de Direita, como as “donas” do capitalismo.
Esta tendência cresceu com globalização e hoje assume contornos maquiavélicos. Acredita-se que o sistema capitalista interessa às Direitas, é por elas mantido e apenas as serve, a despeito de todos os outros milhões de pessoas, que não passam de pequenas engrenagens neste enorme engenho que serve a poucos. Assim, as diferentes Esquerdas político-doutrinárias criaram o dogma de que o capitalismo é um sistema papão, gerido por meia-dúzia de pessoas, protegidos e apadrinhados pela Igreja Católica, que tem como único objectivo a “exploração do homem pelo homem” (terminologia cara à doutrina marxista). É o verdadeiro mito do mundo ocidental (muito especialmente na Europa), que serve como pano de fundo a todas as teorias da conspiração ocidentais. As Direitas (todas elas, sem qualquer tipo de distinção) são apresentadas como a retaguarda doutrinária desta meia dúzia de senhores do mundo e servem apenas para os proteger e branquear as suas acções malévolas.
Já para si, estas doutrinas (de Esquerda) chamaram a defesa das liberdades e direitos individuais, apostadas em marcar a sua diferença em relação às direitas: do seu lado da barricada está a defesa do Homem - considerado na sua universalidade -, das marcas humanistas que ainda subsistem na contemporaneidade. Do outro lado estão os reaccionários (termo bem à moda portuguesa), que são corruptos, que não têm qualquer interesse no bem comum, apenas se interessam pelo enriquecimento fácil, que se servem da política para os seus interesses egoístas. É a famigerada diferença propalada pela Esquerda: nós defendemos o progresso para todos, enquanto vocês defendem apenas os vossos interesses.
À partida parece que, de tão estapafúrdia, esta teoria não pegaria. Mas a verdade é que pegou (aliás, qualquer cidadão medianamente informado, que se julgue “diplomado” em teoria política, acredita piamente nesta fábula. O seu voto apenas diverge porque muitas vezes vota nas pessoas e não nas doutrinas).
E as várias Direitas democráticas que nasceram nos alvores do movimentos liberais contra os totalitarismos monárquicos, que lutaram contra as tendências ditatoriais comunistas, deixaram que a Liberdade - esse património que também é seu – se quedasse nas Esquerdas democráticas. É este o primeiro grande erro das Direitas na contemporaneidade. O segundo é o de não conseguir demonstrar que as respostas para subversões do capitalismo globalizado residem na libertação possibilitada pela informação livre que é o advento da própria globalização. O terceiro é o de não passar a mensagem de que o capitalismo hoje não tem rosto, não tem líderes, não tem donos (ainda voltarei a este tema).
O quarto pecado é o de não conseguir conciliar um conceito de Estado liberal (em todas as suas valências) com uma estrutura (convincente) que substitua o famigerado Estado-Providência, que também foi uma invenção sua. Numa frase: assumir sem vergonha a sua matriz liberal, sem esquecer que a política deve ser a regulação ética da economia.
O quinto erro – e, na minha opinião, o mais letal para a Direita portuguesa – é o de nunca ter assumido estes erros e ter acreditado na – e pior, de ter agido de acordo com - fábula inventada pela Esquerda.
As democracias estão doentes. Às Direitas compete demonstrar que ainda conseguem apresentar soluções. É este o desafio para os próximos anos. Espero não continuar desiludido!
PS - Bom fim-de-semana a todos.
3 comentários:
Acabas por reflectir sobre as "direitas" de uma forma generalista, mas ser de direita em França não é o mesmo que professá-la em Portugal. Ou estarei errado?
Qualquer semelhança entre o Le Peng e o Paulo Portas é pura coincidência. Talvez usem o mesmo champoo... :)
olá Sancho,
eu gosto sinceramente do que escreves. Mas ultimamente só aparecem uns testamentos...é difícil de chegar ao fim. Não poderias ser mais sintético?
beijos,
Marisa Frade
Caro anónimo,
eu falava de Direitas democráticas e para mim o Le Pen e a sua Frente Nacional não o são. Quanto à questão da diferença entre as direitas europeias, exactamente por não serem a mesma coisa é que falo no plural.
Marisa,
prometo sinceramente passar a ser mais comedido.;)
Sancho Gomes
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