16.5.06

Casar? Contra quem?

Dizem os críticos, a Igreja e muita outra gente, incluindo especialistas diversos e outra arraia miúda que o casamento anda pelas ruas da amargura e em profunda decadência. Confesso que já tinha dado pelo assunto. Basta olhar à volta e para exemplos meus conhecidos para perceber o suposto drama da situação: o casamento está, de facto, em declínio. Quer dizer, o pessoal até se casa mas, problema central, depois também se divorcia, o que é uma forma de batota e um apetitoso novo segmento de negócio no campo das apostas temporais. Ultimamente, e pelos números avançados, tese e antítese andam de mãos dadas, na relação de 2-para-1. Ou seja, em cada dois casamentos, um termina em divórcio. Não me parece trágico porque na realidade há muitos motivos para acabar com um casamento (falta de adaptação, traição, ciúme, cheiro a chulé, mau hálito, aumento de peso, envelhecimento precoce, incompatibilidade sexual, celulite, existência de uma única televisão, pés frios, a nova colega de trabalho, a Sporttv, a sogra, etc) e qualquer um deles é extremamente tentador. E seria sempre pior se a relação fosse de 100%.

Analisando bem, no deve e no haver, a balança parece pender mais para o divórcio do que para a manutenção do casamento. Convenhamos que a maioria do pessoal anda com pouca paciência para o assunto. Ninguém dá o braço a torcer quando as coisas começam a correr mal e como os bancos facilitam imenso ninguém precisa no fundo de regressar para casa dos pais. O casamento é ainda um acto que pressupõe alguma predisposição para assumir um contrato: um contrato entre duas pessoas, com a agravante de ter testemunhas que jamais nos deixarão mentir. O certo é que à primeira afronta, ruído, desconsideração, discussão, desentendimento o pessoal farta-se. Farta-se da cara metade como do cozido à portuguesa do almoço. E bate com a porta. Tão fácil se sair como se entrou.

Num tempo de egoísmo, olhar para o próprio umbigo está na moda e poucos parecem dispostos a grandes sacrifícios individuais em prol do colectivo (principalmente se o colectivo é apenas dois). Ninguém quer quebrar ou reconhecer que está errado, que não muda, que não se adapta, que não quer. Vacilar parece ser igual a dar sinal de fraqueza num jogo se soma nula ou negativa. Mas o erro está na ordem dos factores, porque o casamento vem primeiro do que a experiência em comum. Logo se vê, deve ser o pensamento mais recorrente nos pombinhos. Curiosidade interessante: deve ser ao contrário. Experimentar primeiro e depois dar o passo se apetecer e se sentir que se aguenta o chulé e o mau hálito durante os próximos 40 ou 50 anos (número constantemente actualizados pela esperança de vida). Poupa tempo, dinheiro e evita maiores chatices e complicações. E desmonta os mitos dos príncipes encantados e das cinderelas eternas que não existem.

Razão tem um amigo meu que sempre que sabe que alguém se vai casar pergunta com um ar mais cândido deste mundo: contra quem? Nos tempos que correm, nem mais.