22.11.05

Excertos e intervenções I

"O problema português é o atraso. Não são as palavras, o pessimismo, os avisos. O problema português, central, estrutural e, consequentemente, conjuntural é o nosso evidente, cego e nefasto atraso. A raiz da questão está nos embustes, nos truques, no subdesenvolvimento endémico, nas golpadas, na impossibilidade lusitana de viver à custa alheia; o problema não está no mundo, na concorrência dos outros, na globalização, no neoliberalismo; a base da tragédia está na nossa incompetência e neste conservadorismo que impede e bloqueia a mudança e no facto de não vivermos num verdadeiro estado liberal que defenda uma verdadeira economia de mercado; o problema só por si por não se resolver, naturalmente agrava-se; [...] o que os portugueses precisam de ouvir é a verdade; o que os portugueses não precisam de ouvir são os contos de fadas, histórias da carochinha ou novelas intermináveis que soam a falsidade, aleivosia e aldrabice à distância; A crise do Estado é política. [...] E é isso que os portugueses também precisam de ouvir; basta de mentiras, de encobrimentos, de patranhas, de trapaças. Não tenhamos qualquer pejo em assumir o risco e em chamar as coisas pelos nomes. E a crise é acima de tudo política porque o regime notabilizou-se pela ocupação empedernida, cúmplice e desenfreada do Estado e pela apropriação indevida das suas benesses, benefícios e outras espécies de vantagens, deixando-se dominar por um clientelismo político, cancerígeno, que o mina e atrofia e que o impede agora de respirar. Este clientelismo sobrevive há demasiado tempo e com a complacência dos partidos que se vão alternando na cadeira do poder, onde são já mais de cinco milhões aqueles que directa e indirectamente dependem do Estado nas suas mais diversas formas e feitios. Talvez seja por isso que as campanhas eleitorais em Portugal sejam gigantescas fraudes onde tudo se cala, tudo se esconde, tudo se evita. Em nome da paz podre, do silêncio cúmplice, do grito mudo, canta-se música alegre e anedotas giras para fazer rir o Zé Povinho enquanto se lhe abre a caça ao voto. É claro que ele acredita. Que cegamente acredita. Como recentemente acreditou no oásis no deserto que lhe garantia ir baixar os impostos, produzir 150 mil empregos ou aumentar as pensões de reforma dos portugueses."